Comuna de Paris

Comuna de Paris

A Comuna de Paris foi o primeiro governo operário da história, fundado em 1871 na capital francesa por ocasião da resistência popular ante a invasão por parte do Reino da Prússia.

Em 1870, ocorreu a guerra franco-prussiana, na qual a França fora derrotada pela Alemanha. A Alemanha ainda não era um estado formado, era dividida em estados autônomos : Saxônia, Baviera, Hanôver, Baden, Turíngia, Renânia, Westfália, entre outros, destacando o forte estado da Prússia.

Barricadas erguidas pelos communards em frente à Igreja da Madalena
Barricadas erguidas pelos communards em frente à Igreja da Madalena

Na França, a derrota significou um colapso no regime imperial. A derrota francesa na guerra envergonhou os franceses, e o acordo de armistício humilhou o país. A guerra agravou a crise econômica no país, este cenário gerou um movimento social dos operários parisienses, conhecido como Comuna de Paris.

Quando o governo francês tentou desarmar a população de Paris, obedecendo as condições de armistício assinado com os alemães, os operários franceses se revoltaram, tomaram o poder em Paris, e obtiveram o apoio a Guarda Nacional, em 18 de março de 1871. Por dois meses, Paris foi administrada pelo Comitê Central Revolucionário.

Em 26 de março de 1871, realizaram-se eleições para escolher os membros do Conselho Comunal. A Comuna de Paris decretou a separação entre Estado e Igreja, o fim do trabalho noturno nas padarias e a reabertura das fábricas.

Isolada e cercada, a Comuna se enfraqueceu, o combate se desenrolou até o mês de maio. Foram vencidos todos os operários, depois de 72 dias no poder da cidade.

A história moderna registra algumas experiências de regimes comunais, impostos como afirmação revolucionária da autonomia da cidade. A mais importante delas — a Comuna de Paris — veio no bojo da insurreição popular de 18 de março de 1871. Durante a guerra franco-prussiana, as províncias francesas elegeram para a Assembleia Nacional Francesa uma maioria de deputados monarquistas francamente favorável à capitulação ante a Prússia. A população de Paris, no entanto, opunha-se a essa política. Louis Adolphe Thiers, elevado à chefia do gabinete conservador, tentou esmagar os insurretos. Estes, porém, com o apoio da Guarda Nacional, derrotaram as forças legalistas, obrigando os membros do governo a abandonar precipitadamente Paris, onde o comitê central da Guarda Nacional passou a exercer sua autoridade. A Comuna de Paris — considerada a primeira república proletária da história — adotou uma política de caráter socialista, baseada nos princípios da Primeira Internacional dos Trabalhadores.

O poder comunal manteve-se durante cerca de quarenta dias. Seu esmagamento revestiu-se de extrema crueldade. De acordo com a enciclopédia Barsa, mais de 20 000 communards foram executados pelas forças de Thiers.

O governo durou oficialmente de 26 de março a 28 de maio, enfrentando não só o invasor alemão como também tropas francesas, pois a Comuna era um movimento de revolta ante o armistício assinado pelo governo nacional (transferido para Versalhes) após a derrota na guerra franco-prussiana. Os alemães tiveram ainda que libertar militares franceses feitos prisioneiros de guerra para auxiliar na tomada de Paris.

Precedentes

A população francesa já havia enfrentado, após a Revolução Francesa, uma revolta em Fevereiro de 1848, responsável por destituir o “rei burguês” Luís Filipe d’Orleans, dando fim à monarquia de Julho e instaurando a Segunda República Francesa. Entretanto, após um golpe de estado por Luís Bonaparte, conhecido como “O Outro 18 de Brumário”, Bonaparte instaurou o Segundo Império Francês e proclamou-se Napoleão III. No governo de Napoleão III, a França envolveu-se em atritos constantes com a Prússia, relacionados à sucessão espanhola (veja Guerra franco-prussiana). Com um telegrama falsificado por Otto Von Bismarck, extremamente ofensivo ao povo francês, Napoleão III declarou guerra à Prússia.

No entanto, o exército prussiano estava mais bem preparado, vencendo facilmente os franceses. O imperador francês foi feito prisioneiro em Sedan. Com isso, foi proclamada a Terceira República Francesa legitimando um governo provisório de defesa nacional para o qual Louis Adolphe Thiers foi eleito presidente.

O armistício e a Comuna

Wilhelm I foi coroado Imperador da Alemanha no Palácio de Versalhes. Bismarck ao centro, de branco.
Wilhelm I foi coroado Imperador da Alemanha no Palácio de Versalhes. Bismarck ao centro, de branco.

O Governo Provisório, com sede na prefeitura de Paris, iniciou um processo de capitulação da França entregando a maior parte de seu exército permanente bem como suas armas a contragosto da população parisiense. O único contingente agora armado era a Guarda Nacional, formada em sua maior parte por operários e alguns membros da pequena burguesia.

Convictos na resistência ao exército estrangeiro, a Guarda Nacional assaltou a prefeitura e expulsou os membros da assembleia que se instalariam em Versalhes. A administração pública de Paris agora se encontrava nas mãos do Comitê Central da Guarda Nacional que manteria conversações com Versalhes até 18 de março, quando o presidente Thiers mandou desarmar a Guarda Nacional numa operação sigilosa durante a madrugada daquele dia. Pegos de surpresa, a população parisiense expulsa o contingente de Thiers dando início à independência política de Paris frente à Assembleia de Versalhes culminando com a eleição e a declaração da Comuna em 26 e 28 de março.

Apesar da evidente disposição do povo parisiense em resistir, a Assembleia de Versalhes acabou assinando a paz com os alemães. Num episódio humilhante, Guilherme I, o soberano alemão, foi coroado imperador do Segundo Reich na sala dos espelhos do Palácio de Versalhes.

Realizações da Comuna

O governo revolucionário foi formado por uma federação de representantes de bairro (a guarda nacional, uma milícia formada por cidadãos comuns). Uma das suas primeiras proclamações foi a “abolição do sistema da escravidão do salário de uma vez por todas”. A guarda nacional se misturou aos soldados franceses, que se amotinaram e massacraram seus comandantes. O governo oficial, que ainda existia, fugiu, junto com suas tropas leais, e Paris ficou sem autoridade. O Comitê Central da federação dos bairros ocupou este vácuo, e se instalou na prefeitura. O comitê era formado por Blanquistas, membros da Associação Internacional dos Trabalhadores, Proudhonistas e uma miscelânea de indivíduos não-afiliados politicamente, a maioria trabalhadores braçais, escritores e artistas.

Eleições foram realizadas, mas obedecendo à lógica da democracia direta em todos os níveis da administração pública. A polícia foi abolida e substituída pela guarda nacional. A educação foi secularizada, a previdência social foi instituída, uma comissão de inquérito sobre o governo anterior foi formada, e se decidiu por trabalhar no sentido da abolição da escravidão do salário. Noventa representantes foram eleitos, mas apenas 25 eram trabalhadores e a maioria foi constituída de pequenos-burgueses. Entretanto, os revolucionários eram maioria. Em semanas, a recém nomeada Comuna de Paris introduziu mais reformas do que todos os governos nos dois séculos anteriores combinados:

O trabalho noturno foi abolido;
Oficinas que estavam fechadas foram reabertas para que cooperativas fossem instaladas;
Residências vazias foram desapropriadas e ocupadas;
Em cada residência oficial foi instalado um comitê para organizar a ocupação de moradias;
Todas os descontos em salário foram abolidos;
A jornada de trabalho foi reduzida, e chegou-se a propor a jornada de oito horas;
Os sindicatos foram legalizados;
Instituiu-se a igualdade entre os sexos;
Projetou-se a autogestão das fábricas (mas não foi possível implantá-la);
O monopólio da lei pelos advogados, o juramento judicial e os honorários foram abolidos;
Testamentos, adoções e a contratação de advogados se tornaram gratuitos;
O casamento se tornou gratuito e simplificado;
A pena de morte foi abolida;
O cargo de juiz se tornou eletivo;
O calendário revolucionário foi novamente adotado;
O Estado e a Igreja foram separados; a Igreja deixou de ser subvencionada pelo Estado e os espólios sem herdeiros passaram a ser confiscados pelo Estado;
A educação se tornou gratuita, secular, e compulsória. Escolas noturnas foram criadas e todas as escolas passaram a ser de sexo misto;
Imagens santas foram derretidas e sociedades de discussão foram adotadas nas Igrejas;
A Igreja de Brea, erguida em memória de um dos homens envolvidos na repressão da Revolução de 1848, foi demolida. O confessionário de Luís XVI e a coluna Vendôme também;
A Bandeira Vermelha foi adotada como símbolo da Unidade Federal da Humanidade;
O internacionalismo foi posto em prática: o fato de ser estrangeiro se tornou irrelevante. Os integrantes da Comuna incluíam belgas, italianos, poloneses, húngaros;
Instituiu-se um escritório central de imprensa;
Emitiu-se um apelo à Associação Internacional dos Trabalhadores;
O serviço militar obrigatório e o exército regular foram abolidos;
Todas as finanças foram reorganizadas, incluindo os correios, a assistência pública e os telégrafos;
Havia um plano para a rotação de trabalhadores;
Considerou-se instituir uma Escola Nacional de Serviço Público, da qual a atual ENA francesa é uma cópia;
Os artistas passaram a autogestionar os teatros e editoras;
O salário dos professores foi duplicado.

A semana sangrenta

O governo oficial, agora instalado em Versalhes e sob o comando de Thiers, fez a paz com o Império Alemão para que tivesse tempo de esmagar a Comuna de Paris. Como acordado entre os dois países, a Alemanha libertou prisioneiros de guerra para compor as forças que o exército francês usaria contra a Comuna. Esta possuía menos de 15 000 milicianos defendendo a cidade contra o exército de 100 000 soldados sob o comando de Versalhes.

Assim como durante o período da comuna, em sua queda os revolucionários destruíram os símbolos do Segundo Império Francês – prédios administrativos e palácios – e executaram reféns, em sua maioria clérigos, militares e juízes. Na perspectiva dos communards, derrubar a velha ordem e tudo que com ela tinha vínculo era preciso para que novas instituições pudessem florescer.

Ao todo, a Comuna de Paris executou cem pessoas e matou outras novecentas na defesa da cidade. As tropas de Thiers, por outro lado, executaram 20 000 pessoas, número que, somado às baixas em combate, provavelmente alcançou a cifra dos 80 000 mortos. 40 000 pessoas foram presas e muitas delas foram torturadas e executadas sem qualquer comprovação de que fossem de fato membros da Comuna. As execuções só pararam por medo de que a quantidade imensa de cadáveres pudesse causar uma epidemia de doenças.

A Comuna é considerada, por grupos políticos revolucionários posteriores (anarquistas, comunistas, situacionistas), como a primeira experiência moderna de um governo popular. Um acontecimento histórico resultante da iniciativa de grupos revolucionários e do espontaneísmo político das massas, em meio a circunstâncias dramáticas de uma guerra perdida (Guerra franco-prussiana) e de uma guerra civil em curso.