Relacionamentos Superficiais: da liquidez ao desejo de conexão
Vivemos relações cada vez mais conectadas virtual e superficialmente, e menos conectadas real e profundamente. Casal de homem e mulher sentado na cama, utilizando computadores, celulares e tablets para acessar netflix e redes sociais, demonstrando que estão presentes em corpo porém não em mente.
De acordo com muitas teorias psicológicas, uma das primeiras necessidades do ser humano é a conexão e aceitação. Tal necessidade fala do quão desenvolver laços de intimidade, laços emocionais, sentir-se pertencente e aceito – sentimento de ser amável, merecedor de amor, afeto, atenção, cuidado e carinho são primordiais para o bem-estar emocional de qualquer pessoa.
Inicialmente essa tarefa é dos nossos cuidadores – mães, pais e outras figuras significativas da nossa infância que são responsáveis por nos fornecer esse senso de conexão e aceitação. Assim, na adolescência e vida adulta buscamos outras pessoas para que possamos nos vincular: amigos e relacionamentos amorosos.
Vivemos na “era da conectividade”, nunca foi tão fácil visualizar um grande número de pessoas com apenas alguns “cliques”, mas também, talvez não tenha sido tão difícil estabelecer vínculos reais e profundos.
O sociólogo polonês, Zygmunt Bauman, em Amor Líquido traz uma grande reflexão sobre a liquidez das relações: faz uma analogia de que os relacionamentos no século atual se assemelham as relações de consumo experimentadas na nossa sociedade – consumimos e somos consumidos por pessoas, assim como consumiríamos algum objeto de desejo em oferta em um shopping. Ainda para esse autor: “ Elas são “relações virtuais”. Ao contrário dos relacionamentos antiquados (para não falar daqueles com “compromisso” muito menos dos compromissos de longo prazo), elas parecem feitas sob medida para o líquido cenário da vida moderna, em que se espera e se deseja que as possibilidades românticas (e não apenas as românticas) surjam e desapareçam numa velocidade crescente e em volume cada vez maior, aniquilando-se mutuamente e tentando impor aos gritos a promessa de “ser mais satisfatória e a mais completa”. Diferentemente dos “relacionamentos reais” é fácil entrar e sair dos relacionamentos virtuais. Em comparação com a “coisa autêntica”, pesada, lenta e confusa, eles parecem inteligentes e limpos, fáceis de usar, compreender e manusear.”
No entanto, os avanços tecnológicos têm um impacto direto nas novas formas de relacionar-se no século XXI. Estão literalmente em nossas mãos através de smartphones inúmeras possibilidades de conhecer pessoas novas. Em outro artigo abordei o tema “flerte online” para ler clique “aqui”, no qual as pessoas demonstravam interesse através de “curtidas” ou iniciando conversas virtuais, mas tinham pouca iniciativa para realizar o contato pessoal, apesar de parecerem desejosas de tal contato.
Mas o que chama atenção é que ao mesmo tempo em que observamos a liquidez das relações, também observamos o crescente número de pessoas que buscam outras através de aplicativos de relacionamento. Seria a necessidade primordial e evolutiva de conexão e aceitação batendo à porta dessas pessoas?
Temos além do já conhecido aplicativo “Tinder”, o aplicativo Kickoff, segundo seus criadores pretendem “Dar o ponta pé inicial para quem quer algo sério” e agora o recente Happn, mostra quem “cruza” o seu caminho, ou seja, as pessoas que trabalham, estudam, ou vão a lugares comuns com os seus estão ao alcance, desde que ambos tenham o aplicativo instalado.
Concluindo, creio que as novas ferramentas de conhecer pessoas favorecem a possibilidade de iniciar relações, mas o que garante a continuidade delas é o desejo mútuo de aceitar – amar, ofertar afeto, carinho e atenção e se conectar profundamente com o outro e isso exige muito mais do que os cliques e conversas online. Além disso, volto a reafirmar que conexão, pertencimento e vínculos saudáveis são fundamentais para o bem-estar psicológico e emocional.
– Teresa Cristina Martins Silva ( Psicóloga Clínica ) (clinicaacolher)