Os anarquistas devem votar no Haddad (PT) para barrar o fascismo?

Para impedir a vitória do candidato de extrema direita Jair Bolsonaro (PSL) no segundo turno, temos visto militantes e intelectuais (acadêmicos) do PT pedindo o voto dos e das anarquistas, que todos os votos são imprescindíveis “contra o fascismo”, blá, blá, blá… Curto e grosso, perguntamos para quinze anarquistas: os e as anarquistas devem votar no Haddad (PT) para barrar o fascismo? Leia a seguir sete respostas que chegaram na nossa “caixa postal eletrônica”.

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“Olha, quando havia uns 50 anos de trabalho de base, conscientização política, muito engajamento aguerrido e uma direita protofascista que já havia governado ANTES, e a CNT-FAI ‘esqueceu’ de fazer campanha antieleitoral, apenas se conseguiu a liberdade dos sindicalistas e militantes e preparar a revolução. Mas o vírus do primeiro colaboracionismo, o corte pelo qual entrou a bactéria que gangrenou o senso crítico e impediu que a revolução eliminasse as forças pequeno-burguesas contrarrevolucionárias dos partidos comunistas, que impediu que a Anarquia se estabelecesse plenamente – para vitória ou derrota – contra os fascistas, foi exatamente essa primeira concessão.

Eu não chego a usar um anarcômetro para dizer quem é ou deixa de ser anarquista pelo que vai fazer na urna ou na privada. Mas certamente sempre digo, se é para uma ‘conciliação’ – não é pela adesão ao voto mas por outra coisa que é também ‘anarquismo’ e que têm faltado nas nossas fileiras: MONTAR comitês de defesa da cidadania, dos direitos sociais, sem rótulos mas com organização e viés anarquista. Articulando a população local para debater e organizar-se para que os seus direitos sociais sejam defendidos, envolvendo também especialistas jurídicos, assistentes sociais e qualquer pessoa com valor humanista, em moldes de deliberação autogestionária, local, federativa, sem delegar poderes a representantes. SE aparecerem os curiosos, os isentões que eventualmente queiram votar, que o façam, mas sem fazer propaganda onde a verdadeira preparação é para DEFESA contra a onda fascista, ou (torcemos) a simples marola. Isso, e apenas isso, eu poderia colocar como tarefa de viés ‘anarquista’ militante, sem jamais apontar para o voto. Mas para clamar a cada um que vem com essa angústia existencial que mesmo na remotíssima possibilidade de vitória desses idiotas do petismo (que aprovaram todas as leis que tipificam como terrorismo aos movimentos sociais) NADA do ESGOTO que eles favoreceram a abrir, vai voltar para dentro da tubulação. Apenas a LUTA organizada e com capilaridade alcançada por ser encaminhada pela BASE, e sem perspectivas de ANDARES superiores ou COBERTURAS duplex ou triplex, é que poderemos nos contrapor. Não precisa do rótulo anarquista mas qualquer anarquista deve ser capaz de reconhecer que a dinâmica de tais comitês de defesa da cidadania (ou de Salvação Nacional, para um termo mais vintage dos tempos da guilhotina. Mas sem cair no ‘terror’ dos jacobinos pequeno-burgueses). Enfim, devem ser organizações anarquistas.

Resumindo, não penso que se deve votar, se posicionar a favor de qualquer voto. Mas penso que antes de ficar no chavão ‘LUTE!’, que se apresente também a nossa proposta de luta que esteja aberta para tentar uma real articulação social contra o fascismo, o autoritarismo e a quimera do governo representativo democrático. A SOBERANIA está no POVO, e sempre é PERDIDA quando DELEGADA à poderes ‘populares’ eleitos pela coletividade mas com carta branca, ou uma ‘constituição’ frouxa e todas as picaretagens dessa farsa representativa. Só o povo organizado sem pensar em virar ‘eleitorado’ é que conquista a vitória capilar, numa tessitura social – sobre o fascismo que vem sendo cultivado por inúmeros agentes, como o evanjeguismo militante e meritocrata. E outros…” Henrique Zuchi

>> “A luta contra o fascismo deve ocorrer por fora das eleições”

A vitória do Haddad é menos ruim que a do Bolsoline, no entanto o tal voto útil, só é útil para manter a ilusão na farsa democrática. Votar seja em quem for só perpetua o status quo. Acredito que a luta contra o fascismo deve ocorrer por fora das eleições e apesar delas. O PT cometeu muitos erros, poderia ter feito governos melhores mesmo do ponto de vista burguês. Preferiu ignorar os interesses da população e deu continuidade a uma política de criminalização dos movimentos sociais. O PT é responsável pelo crescimento da direita que agora temos de enfrentar nas ruas e não nas urnas.” May Moon

>> “É evidente que não se barra o fascismo pelas urnas”

Não. A própria pergunta não faz muito sentido para os anarquistas. Uma resposta positiva a esta questão significaria o abandono de duas questões bem resolvidas para o anarquismo: 1) Os anarquistas devem votar? 2) É possível barrar o fascismo pelas urnas? Os anarquistas não votam porque a estratégia revolucionária para a classe trabalhadora é sempre a ação direta; jamais a participação da e nas instituições burguesas. Assim, os anarquistas não se perguntam se ele deve votar ou não. Ele se pergunta quais são as táticas que devemos usar diante da vitória deste ou deste outro candidato. Mas, as táticas de luta são sempre através da ação direta, jamais legitimando as estruturas burguesas. E é por isso que o anarquismo não se deforma em burocracia e apresenta sempre táticas combativas, a curto prazo, para construir uma alternativa revolucionária para a classe trabalhadora, em médio e longo prazo, enquanto os revolucionários institucionais terminam por defender a democracia que mata e extermina nossa classe e nosso povo e se deformam em burocratas representantes oficiais da classe trabalhadora. Com relação à segunda questão, no meio dos anarquistas ela só poderia ser recebida com ironia. É evidente que não se barra o fascismo pelas urnas. Como os anarquistas do passado já nos ensinaram só se pode vencer o fascismo esmagando-os através da autodefesa da classe trabalhadora. Se o fascismo for o projeto da burguesia, ela o impõe pelas urnas ou apesar delas. Quanta ilusão achar que se combate o fascismo apertando o botão. Não passa de uma piada reformista tomada a sério por aqueles que fazem ciranda para combater a violência organizada da burguesia.” Carlos Buenaventura

>> “Prefiro o anarquismo!”

NÃO! Fascismo estrutural vermelho X Fascismo doutrinário branco: prefiro o anarquismo!” Vantiê Clínio Carvalho de Oliveira

>> “Jamais podemos nos trair acudindo às urnas!”

Nossas ações, nos momentos mais cruciais, são as que determinam nossa história. E tendo apreendido da nossa memória, não elegemos lideranças, nem votamos, sob circunstancia nenhuma! Estamos contra toda autoridade! O Estado só se fortaleceu com as eleições e a democracia. Aqui não há ditadura. Se hoje temos a necessidade urgente de lutar contra o fascismo, é porque ele está no poder devido à política democrática, da qual a esquerda é parte e cúmplice da manutenção dum sistema que segue agredindo aos que batalhamos, por viver, há séculos. Sendo assim, a luta contra a dominação, da qual os anarquistas fomos e somos parte, não pode se aproximar da competição por governar dos partidos políticos. Um governante, seja qual for, sempre será um obstáculo para o grande desafio anárquico: viver na autonomia, na liberdade individual e coletiva, na defesa da terra, contra todo o que os agrida, sob a certeza absoluta de que podemos existir sem chefias. Na batalha atual, contra o fascismo, não vai ser tomando um banho de alvejante e democracia que vamos mostrar a potencia da nossa visão de mundo, nem nosso total rechaço ao Estado capital e à civilização. O Presente nos demanda mostrar que somos uma real ameaça à dominação, lutando nas ruas, sem dar espaço para o fascismo e seus defensores. Nossos corações, negros, precisam a concordância das nossas ações mais revoltadas! Jamais podemos nos trair acudindo às urnas!!! C. Labrava

>> “Sai pra lá petista, não voto!”

Sinceramente, acho esse papo de voto útil, de anarquista votar no Haddad para barrar o fascismo a maior tolice. E imbecilidade dizer que os anarquistas que não votam ou votam nulo “não estão fortalecendo a luta antifascista, mas ajudando o Bolsonaro a se eleger”. Ora, ora… 1.) Pra começar, não é de hoje que os e as anarquistas combatem os fascistas, não é só em período de farsa e dinâmica eleitoral, de ascensão de um candidato ultradireitista. E arrisco a dizer que, nos últimos anos, desde o final da década de 80 até hoje, mesmo sendo um movimento pequeno, com pouca estrutura e recursos, quem mais lutou contra o fascismo e suas forças foram os e as anarquistas, principalmente os anarco-punks, denunciando, fazendo propaganda e promovendo ação direta. Não, não foi a esquerda institucional endinheirada e seus “milhares” de militantes que agora tem a cara de pau e a safadeza de ficar “apontando o dedo”. E seja dito: alguns jovens anarco-punks até perderam a sua vida ou foram sequelados em embates com gangues de skinheads nas últimas décadas. A propósito, alguns anos atrás quem fazia a segurança nos atos da Apeoesp (sindicato de professores do Estado de São Paulo, ligado ao PT) era uma patota de skinheads musculosos, descerebrados, nacionalistas e violentos. E quem denunciou essa escrotidão? Enfim… 2.) Somos poucos, e numericamente não temos qualquer peso na contagem dos votos. Aliás, será que o Haddad, o “metamorfose ambulante”, pensa que somos milhões? Se pensa, logo logo estará posando com uma camiseta estampada com um “A na bola” e fazendo juras ao anarquismo. Fala sério! Haha.; 3.) Legalismo nunca “matou” o avanço do fascismo, nazismo. Vamos pegar um exemplo atual. Na Grécia, a “esquerda radical”, representada pelo Syriza, está no alto do poder e não barrou o fascismo. Pelo contrário, a presença de partidos e organizações neonazis ainda é significativo em todo território grego, disseminando discursos de ódio, violência e até assassinatos, principalmente contra imigrantes e anarquistas. Mais, a polícia grega, o fascismo institucional, continua violenta e com fortes ligações com organizações abertamente ultradireitistas. Recentemente um ativista gay foi linchado e assassinado em Atenas com envolvimento da polícia e de fascistas. Por outro lado, ainda falando rapidamente do fascismo institucional, o governo “esquerdista” do Syriza juntamente com a “justiça” grega, e trastes direitistas, perseguem, reprimem e despejam espaços e okupações anarquistas ou de imigrantes. Isso sem falar dos campos de refugiados, chamados também de campos de concentração; 4.) Só a presença nas ruas, com várias estratégias, vibração, descentralização e muita propaganda, impedirá ou freará a ascensão fascista e nazista. E só acredito num antifascismo anticapitalista, no princípio e nos fatos. Às favas esse “antifascismo perfumado” estilo artistas “globais” milionários. Haha; 5.) Com a eleição de Donald Trump, o antifascismo cresceu nos Estados Unidos, inclusive o movimento anarquista. E a luta está sendo travada nas ruas, que deve ser obrigatoriamente o espaço de atuação dos e das anarquistas, e não mansamente apertando um botãozinho de uma urna ou na mordomia do Palácio do Planalto ou do Parlamento. Mas cada um é cada um. E como diz a minha mãe, cada um que carregue sua cruz. Contudo, essa cruz de votar eu não carrego. Não digo amém nem pra fascista declarado, nem pra reformista. Votar é a porra! Sai pra lá petista, não voto! Ponto. Moésio Rebouças

>> “Votar em Haddad é pagar tributo à legitimidade do Capital”

“Os anarquistas não deveriam votar em Haddad ou em qualquer outro candidato. Chancelar qualquer candidatura é, de uma forma ou outra, aceitar o Estado e o Capitalismo. Ora, o Estado e o Capital são completamente opostos à Humanidade. Não devemos esquecer que o Estado sempre objetiva impor-se ante todos os indivíduos como ente absoluto; logo, contribuir para sua grandeza, aperfeiçoamento e expansão é prestar um desserviço à causa da Liberdade e da Humanidade. Ademais, votar em Haddad é pagar tributo à legitimidade do Capital e trabalhar contra a construção de uma consciência de classe entre os explorados, minando qualquer ideia de projeto alternativo/antagônico ao modelo posto, ao passo que abraçamos o direito e a moral das classes dominantes.“Liberto

Via: agência de notícias anarquistas-ana

Em morosa andança
Ao léu com meu ordenança —
Contemplação das flores.

Kitamura Kigin